
Ana Maria Cemin – 01.07.2025
José Cezar Duarte Carlos, 34 anos, possui uma série de laudos que atestam a necessidade de acompanhamento psiquiátrico constante e controle rigoroso de medicação. Mesmo assim, está há mais de um ano custodiado na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem (MG), onde essas condições não são devidamente oferecidas. Desde outubro de 2020, ele foi diagnosticado com Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) e sofre surtos recorrentes de delírios e alucinações.
Um laudo recente, elaborado por peritos indicados após solicitação do ministro Alexandre de Moraes, confirma que a estrutura da penitenciária é incapaz de prestar o tratamento necessário ao detento, condenado a 17 anos de prisão por se manifestar em Brasília em 8 de janeiro.

“Luto desde o ano passado por uma prisão domiciliar, para que eu possa cuidar do José Cezar. O pedido foi negado com o argumento de que a penitenciária teria suporte do Centro de Referência em Saúde Mental (CERSAM). Mas isso não é verdade: não há parceria, não há viatura para levá-lo às consultas, nem vaga em hospital psiquiátrico. O próprio laudo emitido pela penitenciária na última quinta-feira (26/06) comprova isso”, denuncia Valquíria Mendes Xavier, 36 anos, noiva do detento.
Segundo ela, esse último laudo, apesar de favorável, teria sido alterado. “O primeiro laudo foi emitido em 19/06, dois dias após a solicitação do ministro com data de 17/06. O perito recomendava a prisão domiciliar. No entanto, um novo laudo foi produzido após uma segunda consulta, desta vez com a presença incomum do diretor de ressocialização da penitenciária, o senhor Silva. Ficou evidente que havia pressão sobre o médico”, afirma Valquíria, indignada. A denúncia foi feita após visita social realizada no dia 29/06. “Não tenho provas materiais, mas faço questão de tornar pública essa manipulação”, completa.

O impacto da prisão atinge também sua filha de 12 anos, que enfrenta um quadro de saúde mental semelhante ao do pai. “Ela está em sofrimento profundo. A ausência do pai agravou muito o estado dela. E para piorar, estamos enfrentando sérios problemas com o auxílio-reclusão. O benefício, que é de um salário-mínimo e deveria ser destinado à filha, só foi repassado nos meses de outubro, novembro e dezembro do ano passado. Já ingressamos com recurso administrativo e, se necessário, vamos acionar a Justiça. Essa é a única forma de garantir que o José Cezar continue cumprindo com suas responsabilidades paternas mesmo em regime fechado”, desabafa Valquíria.
José Cezar está preso desde 06/06/2024, após operação da Polícia Federal que prendeu mais de 200 manifestantes dos atos de 8 de janeiro, sob o argumento de risco de fuga para o exterior. Ele foi detido em casa quando já cumpria medidas cautelares, usava tornozeleira eletrônica e se apresentava semanalmente ao Fórum, mantendo o cumprimento de todas as obrigações judiciais até o momento da prisão.

QUADRO PSIQUIÁTRICO
Valquíria Mendes Xavier segue buscando um atendimento humanitário para o noivo. Desde o início, ela se colocou à disposição para cuidar dele por meio de uma prisão domiciliar. Ela relembra que, em 30 de dezembro de 2023, José Cezar sofreu um surto em casa, mas só percebeu que ele estava em delírio e alucinado no dia 4 de janeiro. O episódio resultou em uma internação de uma semana, entre os dias 8 e 15 de janeiro de 2024, em Belo Horizonte (MG). Depois disso, ele deu continuidade ao tratamento em casa, com acompanhamento médico e controle rigoroso de medicação. Segundo Valquíria, ele estava em processo de recuperação e reconstrução de sua vida.

Nas semanas que antecederam a prisão, o médico responsável ainda monitorava como ele reagia aos medicamentos. Foi no auge desse processo de cura, no dia 6 de junho, que José Cezar foi detido. “Naquela manhã, ele estava relativamente bem, sem sinais de delírios ou alucinações. Mas no dia seguinte, já na cadeia, as alucinações retornaram. Notei isso imediatamente durante a visita. Ele voltou a apresentar os mesmos sintomas do surto de janeiro. Alertei os guardas que ele estava em crise psicótica e precisava ser levado com urgência para a enfermaria. Felizmente, atenderam meu pedido”, relata. Ainda segundo ela, nesse episódio, o noivo ficou seis dias sem se alimentar, sem tomar a medicação e ingerindo pouquíssima água.
Morador de Belo Horizonte, José Cezar é professor de Educação Física e trabalha como motoboy. Em março de 2024, foi condenado a 17 anos de prisão por estar abrigado em um dos prédios da República em Brasília, durante os atos de 8 de janeiro de 2023 — justamente enquanto ocorria repressão policial com helicópteros jogando bombas de efeito moral sobre os manifestantes e tiros de balas de borracha.
A DEFESA DE JOSÉ DISPÕE DE MUITOS LAUDOS SOBRE O COMPROMETIMENTO DA SAÚDE E DA NECESSIDADE DE ATENDIMENTO ESPECIALIZADO, ALÉM DE CUIDADOS DE FAMILIARES.




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