Por Ana Maria Cemin – Jornalista
23/09/2023 – (54) 99133 7567
Vanessa Garcia Assem Mathar, 38 anos, é mãe de Samira, 4 anos, e de Anibal, 6 anos. É casada com o preso político Thiago de Assis Mathar, de 43 anos, condenado a 14 anos pelo Supremo Tribunal Federal. Ela não consegue contar para os filhos que o pai foi para Brasília no dia 6 de janeiro e foi preso por estar caminhando dentro do Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro de 2023. Então, ela diz para as crianças que ele está trabalhando na capital federal e isso faz com que as expectativas das crianças aumentem. “Meu filho reza todas as noites e, dias desses, Anibal fez uma oração para Deus mudar a ideia do pai para que ele volte a trabalhar aqui em São José do Rio Preto”, me conta. “Eu ensinei aos meus filhos que quem é preso é bandido. Como vou contar para eles que o pai está preso? Não consigo!”. Vanessa continua trabalhando e, desde janeiro, é a única renda da família. Como as crianças são pequenas, a sua mãe a ajuda no período da manhã e à tarde ela leva os dois para a escola. A seguir, o resumo de minha conversa com ela.
Vanessa trabalha numa empresa que vende produtos para segurança eletrônica em São José do Rio Preto, SP. No dia do julgamento dos presos políticos pelo STF, 14 de setembro, os funcionários das duas unidades da empresa pararam em frente à televisão para acompanhar o tribunal. Além do julgamento do seu marido, outros dois manifestantes de 8 de janeiro foram julgados pelos ministros do STF: Aécio Lúcio Costa Pereira, 51 anos, Matheus Lima de Carvalho Lázaro, 24 anos. Ambos foram condenados a 17 anos de prisão.
“Nós assistimos às condenações de inocentes, sem prova alguma, e ficamos chocados. Todos na loja viram que não havia prova nenhuma contra Thiago”, relata. “Na audiência de custódia, os policiais falaram que a única coisa que viram do Thiago foi que ele ajudou pessoas que estavam passando mal. Meu marido é muito bom, ele é muito sistemático, não pegaria nada de ninguém e nem quebraria ou faria algum mal a alguém”, diz.
“Eu fiquei impressionada com o que eles fizeram com as imagens apresentadas no julgamento, porque nossa empresa é especializada e só são válidas em juízo as gravações de imagens que não são cortadas. O que podem provar se as imagens foram interrompidas, cortadas. Não servem para prova de nada”, comenta a esposa.
Na sua avaliação, o erro do marido foi entrar num prédio público para conhecer e ficar uma hora lá dentro, caminhando sem se importar com o que estava acontecendo. Indignada com o fato de que até agora nenhum dos verdadeiros depredadores foi julgado, ela pergunta: “Cadê o julgamento de quem quebrou aquele relógio histórico? E os demais que quebraram móveis, vidraças e tudo mais? As imagens que o STF tem do Mathar é dele andando dentro do prédio e isso eu acho que não é crime.”
CANTOS E LOUVORES EM FRENTE AO QG
Thiago, Vanessa e as crianças frequentaram o QG de São José do Rio Preto, aonde iam para cantar louvores, o hino e fazer orações. “A gente não conversava muito com o pessoal de lá, não chegamos a fazer amizade, mas íamos seguidamente. Na 6ª feira, dia 6 de janeiro, Thiago chegou em casa e disse que tinha uma vaga no ônibus para ir para Brasília, coisa rara. Em geral, o ônibus estava sempre lotado. Ele me disse que estava com vontade de ir e eu apoiei. Não fui porque a volta seria na segunda-feira e eu não poderia perder horário no meu serviço.
O ônibus que saiu naquele dia com o pessoal da nossa cidade estava lotado, porém nos falaram que passaria pelo QG um ônibus de Penápolis e ele ficou até a meia noite esperando para pegar. Na mochila, que eu mesma preparei para ele, Thiago levou bolacha de água e sal, garrafa com água, uma blusa, material de higiene, celular e carteira. Carregava, ainda, uma bandeira do Brasil. Depois de tudo acontecer, vários veículos de imprensa disseram que nós somos de Penápolis e que Thiago é agricultor. Um absurdo! Nem conhecemos esse local. Só para esclarecer, ele trabalhava até dois anos atrás com o pai dele no porto de areia em Votuporanga, onde temos a nossa casa por lá. Só que era muito trabalhoso ir e vir entre as duas cidades e ele decidiu trabalhar como autônomo aqui em São José do Rio Preto. Chegou a trabalhar em duas empresas como funcionário e estava se encaminhando para uma terceira.
Voltando para Brasília…O meu marido me ligou do QG no sábado e disse que dormiu numa barraca emprestada. Falou que estava com pouca bateria no celular e que era complicado carregar por lá, então encerramos rápido a nossa conversa. Ele deu um tchau para as crianças e não ligou nunca mais. Ou melhor, alguém permitiu que ligasse da Delegacia de Polícia e logo em seguida ele foi preso. Isso era domingo, um pouco depois da meia-noite. Naquele domingo, passamos o tempo todo na frente da televisão acompanhando tudo que estava acontecendo em Brasília, totalmente apreensivos, sem saber o que estava acontecendo com ele.
SAUDADES
“Eu conheço o Thiago há muito tempo, de quando fazíamos a faculdade na minha cidade, em Garça, SP. Ele fazia Engenharia Florestal e eu Psicologia, e foi na universidade que nos conhecemos quando eu tinha 17 anos. Ele sempre foi calmo e muito quieto, inclusive todo mundo sempre disse que “Mathar não tem boca para nada”. Ele realmente sempre foi assim e o meu filho é igualzinho. Durante o namoro, quando eu comecei a trabalhar em São José do Rio Preto, ele voltou para a cidade dele, que é Votuporanga. Depois de alguns anos, nós noivamos, casamos e tivemos os nossos dois filhos. Ele é uma pessoa extremamente maravilhosa e jamais conseguiria fazer algo errado. Um exemplo disso é a ida ao mercado com a minha mãe, que tem 70 anos. Ele a deixava na frente do mercado e, então, ela dizia: estaciona aqui na vaga do idoso. Ele perguntava a ela: A senhora está com o cartão do idoso? Ao que ela respondia que não. Então ele explicava que não era possível estacionar numa vaga de idoso sem cartão, por ser irregular. É esse homem preocupado em fazer tudo certo, dentro da lei, que o STF acusa de crimes que ele não cometeu e que o condenou a 14 anos de prisão.” Vanessa Garcia Assem Mathar, 38 anos