Por Ana Maria Cemin – Jornalista
26/06/2023
É grave a situação dos cerca dos 250 manifestantes de direita que ainda estão nos presídios Papuda e Colmeia em Brasília, com perdas de peso acima de 20 kg. Alguns advogados, como o do índio xavante Sererê, estão literalmente gritando aos quatro ventos que o seu assistido não sobreviverá por muito tempo, isso com base em laudos médicos. Porém, do lado de fora dos presídios, há uma inércia total para solucionar esse problema humanitário. Há o silêncio absoluto da OAB e dos demais órgãos de proteção à vida humana.
O que chega ao público são os relatos dos manifestantes de direita presos nos dias 8 e 9 de janeiro que estão em casa, com tornozeleira eletrônica. Muitas vezes não conseguiam comer, mesmo com muita fome. Os advogados acompanham o declínio físico e emocional de seus assistidos a cada encontro virtual ou presencial. Eles definham a olhos vistos.
A advogada Fabiana Regina Carvalho de Souza fez um estudo da última contratação realizada por licitações pela SEAPE – Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal, que é o órgão administrativo responsável pelas contratações prisionais, inclusive da alimentação presidiária, concluindo pela impossibilidade da entrega dos alimentos com a mínima qualidade perante os valores adquiridos.
O estudo da Dra. Fabiana revela ser impossível servir alimentos pelo valor contratado. O que está sendo entregue aos presos políticos, então? Outra questão a ser questionada é há quanto tempo o Estado é negligente no aspecto da alimentação dos presos do Papuda e Colmeia, visto que não é a primeira vez que esse assunto surge nas notícias. Estas respostas precisam vir à tona, porque se trata de absoluta falta de humanidade.
Um dos aspectos que mais chama a atenção do contrato com a Vogue Alimentação e Nutrição Ltda, em vigor desde 2020, é o valor estimado para a alimentação de um preso em quatro refeições: café da manhã, almoço, janta e lanche noturno/ceia. O valor estimado naquele ano era de R$ 22,84 (vinte e dois reais e oitenta e quatro centavos), mas a Vogue se dispôs a fazer pelo valor de R$ 9,18 (nove reais e dezoito centavos). Ou seja, a empresa ofereceu um desconto de 60% ao participar do pregão, cujo edital de licitação de preparação e fornecimento de alimentação prevê as quatro refeições. Mesmo com reajuste o valor em 2023 sequer é a metade do valor referenciado em 2020, isso antes da pandemia e da guerra, bem como falta de insumos e acelerada inflação.
O estudo aponta para a origem das reclamações dos presos que envolve os riscos à vida humana pela negligência do Estado, como alimentação estragada, entrega fora do padrão estabelecido pelo edital, ferindo regras humanitárias e a Constituição Federal que resguarda o direito de o preso receber uma alimentação adequada quando estiver sobre sua tutela.
Trouxe a suspeita, ainda, que a empresa vencedora pode pertencer a empresários investigados pela vigilância sanitária no ano de 2017, quando os familiares dos presos reclamaram que a comida era azeda, com mau cheiro e sem itens previstos no contrato, como a carne.
“O menor preço é o tipo de licitação, mas há uma série de outros requisitos para evitar a participação de empresas com ofertas de valores impraticáveis. A lista é grande, mas cito aqui o uso de luvas para servir os alimentos, almoço e janta saudáveis (55% de carboidratos, 15% de proteínas, 30% de lipídeos e 5 gramas de sal por pessoa), mamão deve ser servido duas vezes por semana e melão uma vez por semana. As carnes deverão ser frescas e servidas de forma cozida, grelhada, frita e assada. Não serão permitidos alimentos embutidos no almoço e janta, à exceção de linguiça do tipo calabresa e linguiça de frango”, relata a advogada.
O estudo pode ser lido na íntegra no endereço: https://bureaucom.com.br/governo-paga-r-1198-pela-alimentacao-diaria-de-um-preso-no-papuda/
Pingback: Carne falsa: batida policial comprova relatos de presos políticos - Ana Cemin