HISTÓRIAS CONTADAS POR PRESOS POLÍTICOS NA CELA
22/11/2024
“Ana, agora estamos saindo para ir a um mercadinho onde vamos comprar duas ou três coisa. Estamos andando no meio do nada, tem hortaliças e mato, e o Ângelo disse para eu te contar uma história do Robson, lá do Pará.
Esse nosso colega de cela do Papuda trabalha no meio da floresta Amazônica com extração de madeira e, no tempo vago, também colhe açaí.
Ele contou que numa das empreitadas, quando ele estava no segundo dia de uma saída para o meio do mato que duraria 15 dias, teve um pressentimento…
Nessa empreitada saíram em duas equipes: a dele num lado da floresta e, bem longe, do outro lado da floresta, estava a equipe do irmão.
Como era o segundo dia, o acampamento estava todo prontinho, com a cozinha improvisada funcionando, e já tinha começado a extração da madeira. Era trabalho de dia inteiro cujo resultado seria rachado meio a meio entre ele e o pai, ao final das duas semanas. Robson ainda tirava o açaí no final da tarde, ganho que seria só dele.
E naquele final do segundo dia, lá no alto do pé de açaí, quase 20 metros de altura, sacudia os galhos para os cachos caírem e serem recolhidos por uma pessoa lá no solo. Catava o que podia e trocava de árvore sem descer, pela copa mesmo.
Diz ele que, ao olhar para o horizonte, naquele anoitecer, ele sentiu um aperto no peito no peito e intuiu que estava acontecendo alguma coisa com o pai.
Ele tinha uma equipe contratada para ficar no mato pelo menos duas semanas…Tinha muito trabalho duro pela frente. No entanto, Robson desceu do pé e deu ordens para levantar acampamento para voltar para casa.
Ele preferiu arcar com o prejuízo dos quinze dias de trabalho e conferir como estava o pai.
Já na cidade, na praça onde acertava as contas com os trabalhadores, viu o irmão caminhando em sua direção. Robson olhou para ele e perguntou: “Que porra é essa?”, referindo-se a ele estar de volta antes do tempo, como ele. Então o irmão responde: “Mano, senti uma coisa no peito. Eu acho que o pai não está bem.”
Os dois irmãos foram juntos para a casa do pai e o patriarca pergunta para os dois: “Por que vocês voltaram antes?” e ele ouve de volta a explicação da intuição que tiveram no meio do mato de que algo não estava bem.
De pronto o pai fala: “Está acontecendo um negócio em Brasília e eu quero que um de vocês vá. E se vocês não forem, vou eu”.
Os dois irmãos decidem ir. Nisso, escutam alguém batendo palmas na porta da casa e logo reconhecem o primo, filho do irmão do pai, dizendo que o tio tinha determinado que ele e o irmão fossem para Brasília. “Alguém quer ir junto?”, perguntou o rapaz.
Vão os quatro para a manifestação de janeiro de 2023 e os quatro foram presos.
E aí eu pergunto: o que levou um corretor de seguros lá de Balneário Camboriú, como eu, para Brasília; um cantor de Blumenau como o Sotero; ou um madeireiro lá do Pará?
São muitas coincidências.
A gente sabe que precisa honrar a Deus, agradecer, porque a gente faz parte de um chamado. Ninguém aqui quer se engrandecer, muito pelo contrário: a gente só se sente engrandecido pela oportunidade de servir o Brasil para uma transformação. O grande “cara” do chamado é o cara que a gente segue desde o berço.”
Muitas histórias foram contadas nas celas. Esse é um relato de Robson narrado por Gilberto Ackermann à jornalista. No Complexo Penitenciário Papuda surgiram muitas amizades desde o 08.01.2023, quando o Governo Lula levou para dentro mais de mil pessoas que se manifestavam em Brasília.
Mario Santos
Sinto muita gratidão pelos manifestantes que estavam no 8/01 e sinto que nós brasileiros temos uma dívida com os presos e refugiados, faço oque posso pra ajudar algum desses heróis, mesmo que seja com uma palavra de conforto, de carinho.
Fabiana
O chamado de Deus… Que história impactante. Um dia todas essas pessoas serão honradas. Todas são heróis desse tempo. Que o dia do reconhecimento cheguei logo.
Patriota SC
Sou presa política do dia 09/01/23 (acampamento) naquela fatídica noite tivemos várias chances de fugir, mas pensava “não encostei nen na poeira , pq iriam me prender ? Não sou bandida!” Ledo engano . Tbm estive lá dentro (colmeia) por 12 dias e conheci mulheres de um coração e caráter gigantesco, todas com sentimento de chamado! Artesãs, costureiras, cabeleireiras, mães de crianças com problemas de saúde, MISSIONÁRIA, 2 PASTORAS, E 6 FRERAS … todas com sentimento que precisava ir até Brasília !!!
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