
Ana Maria Cemin – 03/07/2025
Internada desde 13 de novembro de 2024 no Hospital Psiquiátrico e Judiciário Jorge Vaz, Joanita de Almeida, hoje com 57 anos, vive sob monitoramento constante. Um laudo psiquiátrico atesta um quadro clínico gravíssimo, com transtorno mental severo, risco moderado de violência e alto risco de autoextermínio. Diante dessa realidade, o Ministério Público Federal se manifestou a favor da substituição da pena por medida de segurança, conforme previsto no artigo 183 da Lei de Execução Penal.
A decisão não veio à toa: a penitenciária de origem, a José Edson Cavalieri, já havia demonstrado completa incapacidade de prestar o tratamento de que Joanita precisa. A negligência institucional resultou no agravamento de sua saúde e em uma nova internação. Mesmo após decisões judiciais para garantir a continuidade dos cuidados médicos, a unidade prisional se omitiu ou deu respostas evasivas. Joanita necessita de um tratamento contínuo com equipe multidisciplinar — o que inclui cuidados específicos para epilepsia — e que não é ofertado pela estrutura prisional.
Em 14 de junho de 2025, o Supremo Tribunal Federal determinou que o tratamento da paciente deve prosseguir fora do sistema prisional, em ambiente hospitalar, e exigiu da Secretaria de Administração Penitenciária de Minas Gerais a realização de um novo exame médico-legal, para avaliar se ela poderia ou não retornar ao presídio — algo que, até o momento, não teve resposta. Sua defesa também pleiteia prisão domiciliar, considerando as condições precárias e incompatíveis com sua sobrevivência digna no sistema atual.
Mas para entender como tudo isso começou, é preciso voltar no tempo.
Joanita era uma psicopedagoga ativa e respeitada, com 28 anos dedicados à coordenação pedagógica da Associação Adalberto Teixeira Fernandes Filho, em Juiz de Fora. Decidiu fazer uma excursão turística para Brasília, algo que acalentava havia anos. Viajou sozinha, sem conhecer os outros integrantes do grupo, e se hospedou com eles em um hotel da cidade. Estava exultante: realizar aquele sonho simbolizava liberdade, celebração pessoal e o simples prazer de conhecer a capital do seu país.
Foi a última vez que exerceu plenamente seu direito de ir e vir.
No dia 8 de janeiro de 2023, ao buscar abrigo da violência policial no Plenário do Senado — para onde foi guiada por agentes —, foi detida. O que se seguiu foi um percurso de horrores: condenada pelo STF a 16 anos e meio de prisão, passou dois meses na Ala de Tratamento Psiquiátrico do Presídio Colmeia. Lá, afirma ter sido constantemente dopada, exposta a humilhações e privada de assistência médica adequada. À época, ela só fazia uso de medicamentos para controle de epilepsia. Após a experiência, passou a apresentar distúrbios mentais graves que nunca havia manifestado.
Hoje, suas palavras carregam o peso de quem se sente anulada — alguém que perdeu a vida ainda em vida. Fala com frequência sobre a perda de autonomia e a presença constante de pensamentos suicidas. Seu caso expõe, com brutal clareza, as falhas de um sistema que insiste em punir antes de cuidar, e que transforma pessoas em números, apagando trajetórias, sonhos e dignidade.
Leia também a entrevista feita com Joanita antes de ser presa.
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