
Ana Maria Cemin – 26/05/2025
Um caso muito pitoresco está acontecendo nesse exato momento na história do judiciário brasileiro: uma mulher está presa sendo que a sua pena é apenas de restrição de direitos (não de liberdade de ir e vir). O contexto é favorável para absurdos, porque desde 8.01.2023 pessoas comuns que nunca cometeram crimes ao longo da vida tornaram-se rés e foram condenadas por participarem de um protesto contra o governo Lula. Essa manifestação acabou em quebra-quebra, não há provas que individualizem condutas, milhares de pessoas foram presas. Atualmente, vive-se no Brasil a narrativa de “Golpe de Estado”, sendo que os manifestantes estavam desarmados e nem ao menos se conheciam. Como poderiam fazer parte de uma associação criminosa?
Vamos ao caso da deportada dos Estados Unidos!
Em 14 de maio, há 12 dias, o ministro Alexandre de Moraes oficiou o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Balneário Camboriú, de Santa Catarina, para a retirada da tornozeleira da perna da catarinense Cristiane da Silva, 33 anos, com o objetivo de dar início ao cumprimento da pena de restrição de direitos.
A ré do 8 de janeiro foi julgada e condenada entre 21 a 28.02.2025 e em 13 de maio foi emitida e certidão do trânsito em julgado. A pena de Cristiane é de restrição de direito, ou seja, prestará serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo total de 225 horas, participará de curso elaborado pelo Ministério Público, além de estar proibida de sair da comarca e usar redes sociais até a extinção da pena, e pagamento de multa.
O que está “fora da curva” é fato de Cristiane ter sido presa em Fortaleza, CE, na tarde de sábado, dia 24 de maio, quando desembarcou no Brasil, após ter sido deportada pelos Estados Unidos. Ela tentou asilo nos Estados Unidos, por medo de ser presa novamente, como ocorreu em 9.01.2023 por estar acampada em frente ao QG de Brasília. Naquela época ficou presa no presídio Colmeia, onde permaneceu por meses junto com outras patriotas.
O medo de voltar à prisão e a incerteza do resultado do julgamento das pessoas que foram acusadas de crimes de associação criminosa e incitação ao crime, foi o motivo de Cristiane sair do Brasil muito antes dos julgamentos do pessoal acampado no QG iniciarem, no segundo semestre do ano passado. Esse temor a levou ao refúgio na Argentina, onde procurou a Comissão Nacional para os Refugiados (CONARE) para manter-se em dia no país vizinho. Aqui no Brasil ela foi dada como foragida pelo governo brasileiro e a sua Ação Penal, de número 2345 teve o andamento até culminar na condenação, como citei no início do texto.
VOLTANDO À SAGA DO MEDO…
Outra vez assustada, pelo fato de cinco brasileiros serem presos pelo governo Argentino no final do ano passado (e eles ainda se encontram no cárcere no país vizinho), Cristiane decidiu sair da Argentina junto com um pequeno grupo para investir numa dura jornada em busca da liberdade nos Estados Unidos, uma trajetória que envolveu passagens pelo Peru, Colômbia, Panamá e México.
O trecho mais grave que a catarinense enfrentou foi, sem dúvida, a selva de Darién, também conhecida como Tampão de Darién. A floresta conecta a América do Sul com a América Central, localizando-se entre os territórios da Colômbia e do Panamá. Firme em seu propósito de chegar nos Estados Unidos, sentindo-se acuada pelo governo que já havia colocado em presídio, Cristiane pensava que o caminho seria reconstruir a sua vida por lá, longe das ameaças de prisão.
A travessia de Darién em geral dura mais de uma semana e é percorrida a pé, com temperaturas de até 35º C, com risco de desidratação e de contrair doenças como dengue e malária, além de ataques de animais selvagens e a afogamentos nas correntezas dos rios. Além disso, Dárien tornou-se local de atuação de grupos criminosos conhecidos por cometerem atos de violência, incluindo abuso sexual, roubos e tráfico de pessoas.
Ela passou por isso, mas não sozinha. Essa experiência de Cristiane foi vivida junto com pelo menos outras três brasileiras atormentadas desde o 8.01, que permanecem presas nos Estados Unidos e que devem ser deportadas ao Brasil também: Raquel de Souza Lopes, de Joinville, SC; Rosana Maciel Gomes, de Goiânia, GO; e Michely Paiva Alves, de Limeira, SP.
Das quatro, apenas Raquel e Rosana foram julgadas e condenadas a prisão em regime fechado, a 16 anos e meio e 13 anos e meio, respectivamente. Hoje, Rosana e Michele permanecem presas em El Paso, no oeste do Texas; e Raquel de Souza Lopes, em Raymondville, Texas.
A história dessas mulheres é uma ferida aberta no Brasil. A família de Cristiane, até a manhã dessa segunda-feira, 26 de maio, não tem informação alguma se ela será liberada para voltar para Balneário Camboriú.
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