
Ana Maria Cemin – 23/04/2025
“O meu filho foi preso em Brasília devido à manifestação política do 8 de janeiro de 2023, mas como ele tinha vários laudos e receitas do CAPS, sanatório e de remédio para depressão ele foi liberado com a tornozeleira eletrônica. Ele foi preso novamente em 18 de dezembro do ano passado, mas desta vez o levaram para a Penitenciária Professor Aluízio Ignácio de Oliveira, aqui em Uberaba, MG, onde moramos. Depois, o transferiram para a Penitenciária Patos de Minas, que fica a 242 km aqui da cidade, porém só fiquei sabendo dessa transferência por meio de um conhecido. Isso me deixou preocupada, porque eu estava contando os dias para ver o meu filho e, então, fiquei sabendo que ele foi novamente transferido, desta vez para Teófilo Otoni, que fica a 941 km de distância. Eu não sei o que está acontecendo!”.

O relato é de Maria das Graças Leite, 50 anos, mãe de Hamilton Oliveira Pires Filho, 27 anos, um preso político recolhido ao presídio depois que o QG de Brasília foi evacuado na manhã de 9.01.2023. Inicialmente, Hamilton respondia por dois crimes, mas desde outubro do ano passado ele passou a ser acusado de cinco crimes, os mesmos que levam os réus do 8 de janeiro a condenações de 14 a 17 anos de cárcere. Esse aditamento está ocorrendo em vários casos de 8 de janeiro, bastando uma imagem da pessoa próximo a um dos prédios da República.
O motivo de Maria das Graças me procurar foi um pedido do filho, feito no mês passado, durante uma videoconferência. “Ele me pediu por tudo quanto é sagrado para achar você e falar de alguns abusos que ele sofreu dentro da prisão”, diz a mãe.

SOBRE OS FATOS QUE LEVARAM À PRISÃO
Conforme consta nos autos, Hamilton é portador de transtorno delirante grave, faz uso contínuo de medicamentos psiquiátricos e é assistido por equipe do CAPS. Sua condição de saúde exige atenção especializada, em ambiente de segurança emocional e física, o que não está sendo garantido no cárcere. Ele tem fragilidade psíquica e é visível a ausência de risco concreto à ordem pública.
Ele estava em liberdade provisória, cumprindo todas as cautelares, até o comunicado do Juízo da Vara de Execuções Criminais de Uberaba/MG de que o rapaz teria descumprido medida cautelar, fato esse que ocorreu em 26/08/2024.
Bastou uma única vez de descumprimento, mesmo que justificado pelo Defensor Público, para que Hamilton voltasse a ser preso.
A razão que levou Hamilton a descumprir a cautelar em meados de 2024 foi um conflito familiar que resultou em ida à delegacia de polícia para registro de Boletim de Ocorrência, fora do horário permitido pelo Supremo Tribunal Federal.

O FATO QUE ORIGINOU O BO
Em agosto, Hamilton repreendeu o seu sobrinho dentro da mercearia da família por ele estar bagunçando o estabelecimento. Com raiva, o menino foi para casa e informou a mãe. O resultado foi a presença de policiais, a ida à delegacia fora do horário das cautelares (à noite) e o entendimento pela Suprema Corte de que Hamilton merecia voltar ao presídio, mesmo sem data de julgamento previsto.
É importante registrar aqui que no BO não existe laudo médico ou qualquer comprovação de que o rapaz tenha agredido fisicamente o sobrinho. A própria mãe de Hamilton, a dona Maria das Graças, contesta a informação de agressão do neto. “Meu filho é muito correto. Foi corrigir o meu neto que foi para casa chorando e aconteceu tudo isso”, diz a mãe.
Explicando para quem não entende o processo: Hamilton cumpria todas as exigências do STF para manter-se em liberdade provisória. Ao descumprir uma cautelar, os ministros entenderam que a causa desse descumprimento – um BO registrado pela sua irmã referente à reprimenda da criança – era razão para incriminá-lo, de considerar Hamilton uma pessoa perigosa para a sociedade.
Resultado desse entendimento: a Polícia Federal bateu na mercearia onde Hamilton trabalhava em 18.12.2024 e desde então já passou por três estabelecimentos penitenciários.
“Meu filho disse que sofreu uma coisa bem ruim, que ficou todo machucado, mas ele me disse que existe um depoimento onde ele conta tudo que passou dentro da penitenciária de Uberaba. Ele disse que não tem coragem de me contar o que passou, mas que você (Ana Cemin) poderá tornar público tudo isso”, relata Dona Maria das Graças.
A missão nesse momento é encontrar caminhos para descobrir o que Hamilton viveu dentro do cárcere, uma vez que ele se encontra a quase mil quilômetros de distância de casa, sua mãe não tem condições financeiras e o contato com a Defensoria Pública é raro.
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