SOCORRO! A TORNOZELEIRA TOCA 65 VEZES NA HEMODIÁLISE

Ana Maria Cemin – Jornalista – Atualização em 12.07.2024

Essa história escrevi em julho do ano passado, mas continuo em contato com a patriota desde que, pelas mídias sociais, o seu marido me procurou logo depois que ela perdeu a função renal. Mantive a estrutura original do texto daquela época e complementei com o momento atual dessa guerreira. É uma história que tem muito a nos ensinar.

A sua família é o seu maior bem, seu porto seguro. O seu marido, inconformado pelo sofrimento da esposa, me chamou para conversar numa das minhas redes sociais, pedindo ajuda.

O LÚPUS ESTAVA SOB CONTROLE ATÉ SER PRESA

O estado de saúde de Ângela merece cuidados desde 2007, quando foi diagnosticada como portadora de Lúpus, uma doença autoimune em que o sistema imunológico ataca os tecidos saudáveis em várias partes do corpo. Desde então, usa medicamentos para superar os sintomas, como dor nas articulações, febre, dor toráxica, aumento dos gânglios linfáticos, cansaço, entre outros.

A sua situação piorou severamente nos últimos meses, depois de ter sido presa em Brasília por ter se manifestado em frente ao quartel. E o mais interessante é que ela, pelas condições de saúde que apresenta, nem mesmo desceu para a Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro, permanecendo na função de ajudante de cozinha no acampamento. Era a sua segunda vez em Brasília, pois a primeira foi em dezembro, quando gostou da experiência de estar entre patriotas de todo o País.

No início de janeiro, viajou novamente numa caravana para lá e só voltou para casa no dia 19 de janeiro, depois de passar uma temporada no presídio. Voltou para casa com tornozeleira eletrônica! Aquele movimento pacífico e ordeiro foi transformado em algo que jamais imaginou e, para ela, com consequências gravíssimas.

Em todo o período em que permaneceu no Presídio Colmeia, Ângela não foi medicada para o Lúpus, além de ter passado fome, de ter feito uso de roupas molhadas por não ter uma segunda muda nem toalhas para secar-se após o banho.

Dentro da cela, que dividiu com mais de uma centena de presas políticas, Ângela teve uma crise de insuficiência respiratória grave e só conseguiu sobreviver porque outra presa, a Capelã Thereza, tinha junto consigo o seu equipamento respiratório, por também sofrer de uma doença grave. “Foi um ato inesquecível. Quando vi Ângela desfalecendo, coloquei ela no aparelho para ajudar”, conta a pastora, que também usa tornozeleira eletrônica desde que saiu do Colmeia em liberdade provisória. “Graças à Thereza não morri de insuficiência respiratória dentro do presídio”, reconhece Ângela.

“Minha situação de saúde vem piorando muito desde que aconteceu tudo aquilo em Brasília. O uso da tornozeleira está sendo horrível nesse momento em que preciso sair da comarca e me dirigir a Toledo para fazer a hemodiálise pelo SUS.

Meu advogado, o Dr. Hélio Garcia Ortiz Júnior, já entrou três vezes com pedido para retirar a tornozeleira ou pelo menos ampliar a área geográfica, de tal forma que não dispare o tempo todo quando estou fazendo as três horas na máquina. Isso me faz muito mal, minha pressão sobe e eu não sei mais o que fazer. Será que algum político pode me ajudar? Estou desesperada”, me fala.

Até mesmo o pedido feito na Justiça local, em Guaíra, teve uma resposta negativa. Nada podem fazer, porque somente o Superior Tribunal Federal poderá decidir. Ângela sente que o tratamento dela não está indo bem. Os laudos do reumatologista e do nefrologista mostram isso. O que ela pode fazer é apelar por ajuda!

COMO ESTÁ ÂNGELA UM ANO DEPOIS?

JULHO DE 2024 – Depois da publicação da matéria de Ângela, iniciei uma campanha para arrecadar os R$ 10 mil reais para a cirurgia com a ajuda da Liga Conservadora Brasil Alemanha, com quem mantinha parceria para ações humanitárias na ocasião. Poucos dias depois, o Dr. Júnior também conseguiu a ampliação da área da tornozeleira, de forma que não disparava mais durante as sessões de hemodiálise. Ângela e seus familiares começaram a sentir um alívio e esperança.

Em 10 de outubro do ano passado, Ângela enviou para mim a imagem da primeira hemodiálise feita por meio da fístula no braço (foto de capa dessa matéria), demonstrando muito sentimento de gratidão a todos que doaram algum valor para conseguir fazer a cirurgia. Fez todos os exames de protocolo em Curitiba, PR, para entrar na fila de transplante de rins, o que aguarda até hoje.

Ângela foi para a Renalclin pronta para os festejos juninos desse ano. Ela faz hemodiálise pelo braço três vezes por semana. Na foto de capa você ainda pode ver o acesso de hemodiálise pelo pescoço.

Em 22 de janeiro deste ano, Ângela me escreveu contando que foi aconselhada a fazer o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) com o governo para retirada da tornozeleira eletrônica. Isso significava assumir a culpa de crimes imputados a ela que não cometeu. “Preciso aproveitar os meus dias de tratamento com dignidade já que a minha sentença de vida está condicionada a um transplante. Pelo menos não serei julgada pelo ministro Alexandre de Moraes”, me diz.

Livre da tornozeleira eletrônica depois de 15 meses sendo monitorada pelo Estado Brasileiro.

Em 3 de abril, a patriota recebeu a carta de ordem para começar a cumprir o ANPP. Foi ao fórum verificar o valor da multa que foi obrigada a pagar e o serviço de 150 horas de prestação de serviço comunitário. “Estão indicando serviço braçal, mas estou negociando para me remanejar para ajudar de outra forma, pelo meu quadro de saúde complicado. Trabalhei 23 anos como professora. Quando à multa não tem choro, terei que pagar praticamente à vista e não tenho dinheiro. Meu único bem é o carro e precisamos para trabalhar e ir até a clínica para fazer a hemodiálise”, relatou naquele momento. Depois me disse que um grupo de patriotas conseguiu angariar recursos para pagar os R$ 5 mil de multa.

Multa de R$ 5 mil e assumir a culpa do que não fez para evitar o julgamento do STF.

Em 19 de abril, Ângela envia seu primeiro momento sem tornozeleira depois de 15 meses monitorada, com um equipamento transtornando a sua vida 24 horas por dia. A partir de então pode voltar a participar das missas aos domingos, uma das suas atividades proibidas pelas regras do STF.

“Depois que tirei a tornozeleira eu estou tendo um pouco mais de humanidade no tratamento. Me adaptei bem às sessões de hemodiálise que continuam sendo três vezes por semana e por três horas. Se não tivesse assinado o acordo estaria ainda naquela agonia de vai e vem para o fórum, com medo de enfrentar um julgamento que tenho certeza seria injusto como os demais estão sendo. Continuo à base de remédios para dormir melhor e na fila do transplante, aguardando por um rim. Perdi os meus rins, meu direito à defesa justa, perdi até um pouco da crença até mesmo nos nossos políticos e perdi minha dignidade. A única coisa que não conseguiram tirar de mim é a minha fé e o amor que tenho pelo meu país, pelos meus irmãos patriotas que me mostraram que era possível, sim, contar com a ajuda deles. Às vezes as pessoas me perguntam se valeu a pena. Me perguntam se faria novamente essa caminhada, se eu ainda acredito nos ideais Deus, Pátria, Família e Liberdade, e eu falo com toda convicção “SIM”. Nunca fez tanto sentido para mim a letra do nosso hino: Verás que um filho teu não foge à luta”, conclui.

Ângela cumpre as horas sociais no Centro de Convivência da Terceira Idade fazendo artesanato. Quando falamos, faltavam 40 horas das 150 que foram acordadas com o governo federal.

Um comentário sobre “SOCORRO! A TORNOZELEIRA TOCA 65 VEZES NA HEMODIÁLISE

  1. Perola Tuon

    Parabéns pela liberdade! Fez muito bem em seguir com o acordo e ficar livre de outras injustiças. Os políticos não fariam nada por você e merecem que viremos as costas para eles.

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