
Ana Maria Cemin – 8/10/2025
O caso chegou às mãos da advogada criminalista Dra. Taniele Telles de Camargo Padoan ontem, 7 de outubro, data em que ela conversou diretamente com o preso do 8 de janeiro por vídeo. Depois da conversa, ao se deparar com os documentos, ela não hesitou: agiu imediatamente, denunciando o que classificou como uma aberração jurídica e um exemplo cruel de como o sistema pode falhar — e falhar feio — contra um cidadão inocente.
O réu Divânio Natal Gonçalves, 55 anos, manifestante dos atos de 8 de janeiro, está mantido preso há mais de seis meses, mesmo que tenha cumprido religiosamente todas as medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal. A prisão, decretada por erro do juízo da Comarca de Uberlândia/MG, revela uma sucessão de falhas grotescas, que vão desde a omissão de informações básicas até a negligência institucional.
TORNOZELEIRA NA PRISÃO: O SÍMBOLO DO ABSURDO
Divânio foi preso em casa em abril, durante o período noturno, exatamente como determinava a sua cautelar de recolhimento. Estava com a tornozeleira eletrônica ativa, fato ignorado pelas autoridades que o levaram ao Presídio de Jacy, onde permaneceu com o equipamento instalado por mais de uma semana, até que o presídio finalmente o retirasse.
A alegação para a prisão foi de que o réu estaria foragido há sete meses e nunca teria cumprido as cautelares. No entanto, documentos oficiais provam o contrário: ele assinava semanalmente o livro de presença na Vara de Precatórios Criminais de Uberlândia/MG, sob supervisão de um servidor identificado como Lucas, que se recusava sistematicamente a fornecer comprovantes de comparecimento — inclusive quando o réu precisava apresentar à empresa onde trabalhava.
ERROS EM SÉRIE: DO JUIZ AO SISTEMA
O STF solicitou esclarecimentos ao juízo local em fevereiro e agosto de 2024. Na primeira resposta, o juiz confirmou que não havia descumprimento. Na segunda, sem consultar o próprio sistema, afirmou que o réu nunca havia comparecido, levando à expedição de um mandado de prisão.
A defesa, à época, não respondeu à intimação, o que agravou o cenário. Mesmo assim, Divanicio continuou cumprindo todas as cautelares, sem saber que havia um mandado contra ele, até ser preso em 1º de abril.
UMA FILHA SEM PAI E UM TRABALHADOR SEM LIBERDADE
Nesses mais de seis meses de prisão, Divânio está impedido de trabalhar, de sustentar sua filha de seis anos e de exercer sua defesa com dignidade. A criança, segundo relatos, chora diariamente pela ausência do pai, que era o único provedor da família.
DOCUMENTOS IGNORADOS E DIREITOS VIOLADOS
Nos autos do processo, há registros que comprovam que o réu foi incluído no sistema de monitoramento eletrônico em 21/03/2023, com desligamento apenas em 02/04/2025 (após ser levado ao presídio). A defesa aponta que não houve condenação definitiva, e que a prisão preventiva foi usada indevidamente como antecipação de pena, o que é vedado pela Constituição Federal e pelo Código de Processo Penal.
PEDIDO DE LIBERDADE E RESPONSABILIZAÇÃO
Diante da gravidade dos fatos, a Dra. Taniele requereu:
– Liberdade provisória imediata ou substituição por medidas cautelares diversas;
– Ofício à Vara de Precatórios para envio dos relatórios de comparecimento;
– Justificativa do servidor Lucas sobre a recusa em fornecer comprovantes;
– Esclarecimentos do juiz da Execução Penal sobre a omissão de dados;
– Investigação pela Corregedoria do TJMG e pelo CNJ sobre negligência e abuso de autoridade;
– Relatórios oficiais sobre o uso e retirada da tornozeleira eletrônica;
O caso de Divânio expõe uma ferida aberta no sistema judiciário brasileiro: a criminalização sem prova, o desprezo pelo contraditório e a falha institucional que transforma cidadãos em reféns do próprio Estado. A atuação da Dra. Taniele Telles reacende a esperança de que, mesmo diante da máquina pesada da Justiça, a verdade ainda pode prevalecer.
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