Casal preso em 8 de Janeiro pode perder a casa própria

Por Ana Maria Cemin – Jornalista

Revisado em 16/10/2023 e escrito em 21/09/2023 – (54) 99133 7567

No dia 15 de outubro, Camila enviou um pedido de ajuda: ela precisa de uma cesta básica.

Eu conheço a situação dela, porque me concedeu entrevista em setembro. No texto que segue narro a dívida da família na aquisição de um terreno, sobre o qual construíram o seu lar e local de trabalho. Camila e o marido sofrem para pagar o parcelamento e garantir o teto para eles e seus filhos. Com essa prioridade de pagar parcelamento, às vezes falta o básico dentro de casa. Segue a história que escrevi desse momento grave de sua vida.

“Nós precisamos de clientes para conseguir recursos para pagar o reparcelamento de nosso terreno, caso contrário perderemos a casa que construímos sobre ele. Precisamos trabalhar e manter o nosso financiamento do terreno em dia”, me conta Camila, uma das presas políticas que teve a vida prejudicada depois de ser presa em Brasília com o marido e voltarem para casa com as restrições impostas pelo uso da tornozeleira eletrônica. Junto com o marido, ela tem a confecção Kimuk Sport (contato 16 99361 2779) e perdeu muitos clientes, que agora precisa recuperar.

 

O casal trabalha com uma confecção em casa. Faz roupas para a prática de academia e até os dois serem presos no QG de Brasília, em 9 de janeiro, conseguiam renda o suficiente para ter uma vida digna. Os dias de cárcere e o uso de tornozeleira eletrônica fizeram os negócios desandarem.

SEGUE A HISTÓRIA

Há quatro anos o casal Camila Alves Silva Oliveira, 32 anos, e Jessé de Oliveira Vicente, 34 anos, festejaram a conquista da casa própria, construída com tudo que eles sempre desejaram para si e seus filhos. Porém, nesse início do ano, ao saírem de Franca, SP, para Brasília para a manifestação e acamparem no QG em frente ao quartel, a vida virou de cabeça para baixo e o sonho virou pesadelo. No dia 9 de janeiro, simplesmente por estarem no QG, os dois foram levados de ônibus junto com os demais patriotas para o Ginásio da Polícia Federal e lá foi dada a voz de prisão: ela ficou 20 dias no Presídio Colmeia e ele ficou 12 dias no Presídio Papuda. No retorno para casa, os negócios da confecção de roupa e acessórios de academia desandaram e a vida financeira ruiu.

Jesse e Camila são pais de uma menina de 13 anos com problema de sopro no coração e que toma remédio para pressão e de um menino de 8 anos com epilepsia. O casal enfrenta, nesse momento, um problema judicial com a Imobiliária Projeção, que lhes vendeu o terreno a ser pago em parcelas mensais em 10 anos. Pagaram 5 anos em dia, mas a partir deste ano o faturamento da confecção própria que eles têm dentro de casa despencou e deixaram de pagar o parcelamento mensal no valor de R$ 1,700,00. Com muito esforço pagaram uma parcela da renegociação de R$ 3.675,35, mas não pagaram as parcelas do acordo dos meses de maio e junho, no valor de R$ 3.930,80 cada uma. O resultado foi a abertura de um processo contra a família para rescisão do contrato de venda do terreno, onde já construíram sua casa e único imóvel, com a proposta de devolução do valor ao casal de R$ 44.327,57.

 

Ao voltarem de Brasília, depois de presos nos presídios Colmeia e Papuda, tiveram uma série de perdas e a principal dela foi a ameaça de perder o terreno parcelado em 10 anos, onde construíram a casa. Hoje pagam em dia, mas às vezes precisam pedir ajuda de cesta básica para viver. Eles e os dois filhos pequenos.

A pergunta que vem é “E a casa que eles construíram entre 2018 e 2020 como fica?”. O documento recebido por Jessé e Camila tem data de 19 de julho, mas só tomaram conhecimento no dia 21 de agosto. Desde então procuram respostas para entender como equacionar o problema que se avoluma. Os dois usam tornozeleira eletrônica e têm uma série de restrições, como limitação para atender clientes fora do perímetro de Franca, por exemplo. A situação é tão crítica que buscaram ajuda da Associação dos Familiares e Vítimas de 8 de Janeiro (ASFAV) para pagar as contas de energia elétrica e água. No mês de agosto, receberam a terceira cesta básica doada por um centro espírita local. Camila diz que sem o apoio da ASFAV, em especial da presidente Gabriela Ritter, não teria conseguido avançar nas negociações com a imobiliária. Hoje eles mantêm o parcelamento em dia, porque tiveram o apoio de uma doadora anônima que entrou em contato com a ASFAV. Até o final do ano eles têm uma parcela mensal de R$ 1.760,00 a pagar.  O terreno só ficará quitado em cinco anos. 

“Nós jamais arriscaríamos comprar um terreno e construir uma casa se nossas condições financeiras não fossem boas. Porém, desde que fomos presos em Brasília a nossa vida só andou para trás: perdemos clientes, devolvemos dinheiro para aqueles que não conseguimos atender por estarmos presos e não podemos viajar para fazer as entregas”, relata Camila. Para recomeçar a vida, o casal precisa de clientes que apostem neles, até porque estão sem capital para comprar a matéria-prima e precisam de uma boa entrada no fechamento do pedido. “É muito difícil um novo cliente confiar a esse ponto, ainda mais com o rótulo que nos foi colocado após as prisões de 8 de janeiro”, lamenta. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *