Ana Maria Cemin – 31/10/2024
Quem acompanha de perto a história de Marcos Soares Moreira, de Serra, ES, desde que foi preso em 8 de janeiro do ano passado, sabe o quanto ele sofreu e o estado abalado em que se encontra por conta da forma como foi tratado pelo Estado Brasileiro.
Primeiro ele ficou preso quatro meses no Papuda; depois ficou alguns meses com tornozeleira eletrônica e uma série de restrições; e então foi preso novamente por determinação do ministro Alexandre de Moraes. Esse segundo tempo de cárcere foi mais longo: de setembro do ano passado a abril desse ano. A sua defesa conseguiu que fosse transferido para casa para uma prisão domiciliar que durou até agora, ou seja, sete meses dentro de casa.
Hoje, 31 de outubro, Marcos deu um passo para sair desse sofrimento com a retirada da tornozeleira, após a homologação do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP).
Pelo acordo, ele prestará 150 horas de serviço à comunidade, participará do curso “Democracia, Estado de Direito e Golpe de Estado” e não poderá utilizar redes sociais até concluir essas exigências. Quanto à multa de R$ 5 mil, ele recebeu isenção devido às dificuldades financeiras pelas quais passa no momento.
Detalhe: para o acordo acontecer, Marcos teve que assumir a culpa, ou seja, dizer que fez parte de uma organização que pretendia um golpe de estado. Essa foi a exigência para a tortura encerrar.
“O Marcos já não aguentava mais ver o sofrimento dos familiares em busca do seu sustento, pois, muito embora estivesse em casa, a prisão domiciliar manteve as mesmas características da prisão em regime fechado. Não podia trabalhar, tanto que em mais de uma oportunidade foi realizado o pedido para trabalhar e foi negado. Não podia ir à casa dos familiares, não podia, enfim, fazer nada, a não ser, tomar remédios controlados e dormir na esperança de que em algum momento o milagre da anistia ocorresse ou a justiça fosse feita e reconhecesse de que ele não praticou nenhum crime. Como nem um ou outro resultado saiu, ele decidiu propor o ANPP e este foi aceito. Agora iremos esperar o inicio do cumprimento das condições – esperamos que seja logo, pois, ele deseja refazer sua vida sem qualquer dívida com a justiça ou com quem quer que seja, como sempre fez“, diz a advogada Maria Margarida de Moura Silva.
Vou contar a história de Marcos do fim para o começo, porque talvez seja mais fácil de entender a tortura que viveu.
PRISÃO DOMICILIAR – SUA ÚLTIMA TORTURA
Em 16 de abril, ele saiu da Penitenciária de Segurança Média de Viana, devido à conversão da prisão preventiva em prisão domiciliar.
A volta de Marcos Soares para casa em abril foi uma conquista da defesa que conseguiu provar que ele estava ameaçado de morte dentro do presídio, que foi espancado e apresentou fratura no pé por conta da agressão de um detento da mesma cela.
Naquele momento, Soares se encontrava doente, com a sanidade mental abalada, com traços de depressão, transtorno mental, ansiedade e transtorno bipolar.
A partir de abril, Marcos viveu em prisão domiciliar, proibido de ausentar-se de casa, e tudo isso controlado por monitoramento eletrônico. Estar em casa proporcionou os cuidados necessários ao restabelecimento da sua saúde, porém abalou seus ganhos para a sobrevivência.
O HISTÓRICO DE PRISÕES
O patriota responde pelo inquérito 4921, por ter sido recolhido no QG em frente ao Quartel de Brasília em 9 de janeiro de 2023.
Ele ficou quatro meses preso em Brasília, sendo que o seu ônibus de excursão chegou à Capital Federal após as 17 horas da tarde do dia 8 de janeiro, muito depois das depredações dos prédios, fatos comprovados pela perícia realizada pela Polícia Federal no telefone do Marcos.
Portanto, o Marcos não foi para a Praça dos Três Poderes e, mesmo assim, acabou no Presídio Papuda, ficou quatro meses preso e saiu com tornozeleira de Brasília.
Em 22 de setembro do ano passado, Marcos foi novamente preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes, sob o argumento de que o patriota estava utilizando redes sociais abertas, o que representou o rompimento da medida cautelar da liberdade provisória.
De volta ao cárcere, somente saiu em abril desse ano, com tornozeleira, para a prisão domiciliar.
DECISÃO DE IR A BRASÍLIA
“No começo de 2023, as pessoas estavam revoltadas, assim como eu, por ver uma pessoa colocada para governar a nossa Nação por meio de uma fraude. Descobri que tinha um ônibus saindo para Brasília numa postagem de uma amiga, no WhatsApp, e me inscrevi. Deu tudo certo e às 15 horas do dia 7 janeiro saímos do Espírito Santo rumo à capital federal.
Quando estávamos no Estado de Goiás, várias mensagens começaram a chegar com informações sobre a invasão dos prédios da República – STF, Congresso e Planalto. Todos nós, ainda em viagem, ficamos atônitos com aquilo e não entendíamos o ocorrido, porque o plano era de ficarmos em frente ao quartel de Brasília.
Chegamos por volta das 18h30 e 19h do dia 8 de janeiro e fomos direto para o QG. Não paramos em qualquer outro ponto durante todo o trajeto a não ser em Goiás, quando almoçamos.
O “crime” que eu cometi foi estar dentro do QG instalado numa área militar, local onde eu tinha a proteção dos militares. Tanto é verdade que os próprios militares, devido à lama do acampamento naqueles períodos de muita chuva, colocaram máquinas para limpar e instalaram pallets para as pessoas montarem as barracas em cima. Uma gentileza para que não ficassem no meio do barro. Os militares também forneciam energia elétrica. Então, se alguém financiou o movimento verde e amarelo, esses financiadores talvez sejam os militares.
Posso garantir que eu estava lá de forma legal e pacífica, e não participei de nenhuma manifestação nem dentro e nem fora do QG de Brasília. A única coisa que eu fiz foi uma live à noite, no meu Facebook, mostrando que a Polícia Federal estava tentando entrar no acampamento e o Exército estava evitando a entrada. Depois fui dormir, pois estava cansado da viagem de mais de 24 horas. Acordei e fui preso junto com outras tantas centenas de pessoas que também tinham chegado naquela noite. Por algum motivo, os militares e a polícia permitiram a entrada de ônibus depois dos atos de vandalismo. Essas pessoas ficaram presas em Brasília, em presídios, como eu”, me contou Marcos, em entrevista concedida em meados de 2023.