Ana Maria Cemin – 09/11/2025
Charles Rodrigues dos Santos é pedreiro e na foto dessa matéria ele está com uma arquiteta e seu filho. A imagem é de quando ele ainda podia trabalhar como um ser humano livre. Ele é o primeiro preso político a progredir do regime fechado para semiaberto, porém está há meses confinado sem conseguir um trabalho extramuro, esperando uma oportunidade no CIR-1, do Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal.
Após mais de dois anos em regime fechado, simplesmente por ter estado em Brasília em 8 de janeiro, ele sonha com a oportunidade de trabalho que permita sua saída durante o dia e retorno à noite, conforme prevê a legislação para apenados em regime semiaberto.
Na última semana, a voluntária do 8 de Janeiro Perola Tuon participou de uma reunião com a diretora para Assuntos Sociais e Educacionais da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (FUNAP-DF), Dra. Carla Monteiro, para entender os caminhos possíveis para a empregabilidade de Charles e dos demais presos políticos que estão já na fase do semiaberto ou quase lá. A conversa revelou entraves burocráticos e alternativas viáveis para sua reinserção laboral.
Assim como eu, Pérola dedica boa parte do seu tempo para entender o dia a dia dos presos políticos e seus familiares e, nessa matéria específica, abordamos um tema sensível aos presos políticos que já foram para o semiaberto ou que logo poderão ir dependendo da atuação dos seus advogados. “Diferente das mulheres que foram presas no 8 de janeiro, que puderam voltar para casa e aguardar o julgamento com tornozeleira, mais de uma dezena de manifestantes homens nunca saíram da prisão desde aquela data. São esses que vão passar para o semiaberto em breve”, relata Pérola.
Na avaliação dela, esses serão os primeiros a sair das unidades prisionais a trabalho durante o dia e só voltarão ao cárcere para dormir. Mas é preciso que os advogados providenciem este “caminho”:
- Aecio Lucio Costa Pereira AP 1060
- Charles Rodrigues dos Santos AP 1064
- Claudinei Pego da Silva AP 1403
- Claudio Augusto Felippe AP 1192
- Clayton Costa Candido Nunes AP 1057
- Davis Baek AP 1413
- Fernando Kevin da Silva de Oliveira Marinho AP 1073
- Igilso Manoel de Lima AP 1396
- Matheus Lima de Carvalho Lazaro AP 1183
- João Batista Gama AP 2335
- Leonardo Alves Fares AP 2405
- Jorginho Cardoso de Azevedo AP 1430
- Manoel Messias Pereira Machado AP 1504
- Marcelo Cano AP 1188
- Matheus Fernandes Bomfim AP 1115
- Samuel de Faria AP 2406
- Thiago de Assis Mathar AP 1502
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL É O PRIMEIRO PASSO
A principal barreira identificada, no caso do Charles, foi a ausência de autorização de trabalho expedida pela Vara de Execuções Penais (VEP). Segundo a Dra. Carla, quando o sistema não apresenta essa decisão, é provável que o processo esteja sob segredo de justiça. Cabe agora à defesa de Charles verificar se a autorização existe ou, em caso negativo, questionar judicialmente o motivo da recusa.
TRABALHO EXTRAMUROS X INTRAMUROS
A FUNAP oferece dois modelos de trabalho para reeducandos:
🔹 Extramuros
- O interno é transferido para o Centro de Progressão Penitenciária (CPP), no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA).
- A gestão é feita pela FUNAP do SIA.
- Exige autorização prévia da VEP.
- Há forte demanda por pedreiros em empresas conveniadas como MRV e Consórcio Metrô.
- A remuneração é feita diretamente pela FUNAP, com bolsas que variam entre 70% e 110% do salário-mínimo, além de auxílio refeição (R$ 21,90) e transporte (R$ 11).
- O regime não é regido pela CLT.
🔹 Intramuros
- O interno permanece no CIR e trabalha em projetos internos da FUNAP, como na Fazenda (vaga considerada rara), fábrica ou oficinas.
- Não exige autorização da VEP.
- A remuneração é dividida entre o próprio interno, uma poupança e, opcionalmente, a família.
Empresas parceiras e limitações
A FUNAP mantém convênios com empresas públicas, privadas e do terceiro setor, com destaque para a construção civil. O cadastramento de novas empresas pode levar até seis meses, por isso a recomendação é priorizar as já conveniadas, em casos como Charles.
“A conversa com a entidade teve por objetivo esclarecer os caminhos para que Charles possa ir para o semiaberto na prática, porque ele tecnicamente teve essa progressão de regime, mas até hoje continua trancado no presídio, trabalha numa marcenaria dentro do estabelecimento, ainda que ele esteja numa unidade exclusiva para o regime semiaberto. Quanto estava no regim fechado ele já trabalhava, o que ele deseja é a oportunidade de socialização fora do ambiente penitenciário, por meio do trabalho, como o semiaberto permite”, conclui.
3 comments