Por Ana Maria Cemin – 29/10/2025
Elisa Robson é considerada uma das primeiras exiladas políticas do Brasil dos tempos atuais. Jornalista independente, ela deixou o país em março de 2023, após perceber que sua liberdade e a segurança de sua família estavam em risco. Suas investigações sobre uma suposta aliança criminosa entre líderes latino-americanos — incluindo os presidentes Lula e Nicolás Maduro — revelada por um ex-general venezuelano preso na Espanha e, atualmente, nos Estados Unidos, Hugo Carvajal, colocaram-na na mira de perseguições.
A INVESTIGAÇÃO QUE MUDOU TUDO
“Eu comecei essa investigação no final de 2021. Já tinha ouvido falar de algumas coisas, mas foi nesse período que comecei a prestar atenção nas declarações que saíam, aos poucos, em veículos europeus. Me chamou atenção um personagem que eu não conhecia, falando sobre como as coisas aconteciam de forma ilegal na América Latina. As primeiras declarações dele já me deixaram alerta. Quis entender a origem daquelas informações.”
O personagem era Hugo Armando Carvajal Barrios, conhecido como “El Pollo”, ex-diretor da Inteligência Militar da Venezuela e aliado direto de Hugo Chávez. Em declarações à justiça espanhola, Carvajal revelou uma conexão sólida entre lideranças latino-americanas, nascida no Foro de São Paulo, envolvendo narcotráfico, corrupção e uso de estatais para financiar campanhas políticas.
“Logo depois veio uma bomba: ele deu declarações na Espanha explicando uma conexão sólida entre lideranças latino-americanas, nascida no Foro de São Paulo, envolvendo narcotráfico e estatais. Achei gravíssimo. E ninguém falava nisso no Brasil. Passou uma semana das declarações e nada. Estranhei. Fiquei com aquilo na cabeça e pensei: ‘Por que estão encobrindo essa informação?’”
Foi então que Elisa decidiu fazer uma live para expor o conteúdo das denúncias. A repercussão foi grande nas redes sociais, mas ignorada pela grande imprensa. A partir daí, ela mergulhou no caso Carvajal, acompanhando audiências, declarações e a repercussão internacional.
A VIAGEM À ESPANHA E O LIVRO
Em 2022, Elisa decidiu ir até a prisão de Estremera, em Madri, para tentar entrevistar Carvajal pessoalmente. “Queria entender o que ele tinha de concreto e o que ainda era informação sem consistência.” Segundo ela, Carvajal revelou detalhes de uma aliança entre Lula e Maduro, com corrupção operando via malas diplomáticas, embaixadas e partidos políticos.
Ele citou, por exemplo, voos com cerca de um bilhão de dólares da Venezuela para a campanha de Cristina Kirchner na Argentina. No Brasil, as denúncias envolviam diretamente Lula, inclusive na eleição de 2022. “Ele garante que esse modus operandi se manteve, mesmo após a Lava Jato.”
Em 2022, Elisa publicou um livro com os documentos e informações obtidas. A resposta foi imediata: ataques da velha mídia, tentativas de descredibilização e, mais grave, a inclusão de seu nome em inquéritos do STF, como os das fake news e das milícias digitais.
O EXÍLIO NA FLÓRIDA
“Eu não tinha a intenção de sair do Brasil e quando foi necessário aconteceu tudo muito rápido. Em 40 dias, decidimos e viemos. Reorganizamos toda a família. Meu marido, engenheiro, pediu aposentadoria imediata. As crianças saíram da escola. Viemos por causa da insegurança jurídica no Brasil.”
A decisão foi tomada após perceber que pessoas do governo Bolsonaro com quem ela havia compartilhado informações estavam sendo presas. “Pensei: se elas estão sendo presas só por terem recebido informações, imagina eu, que fui lá, trouxe os documentos e publiquei o livro.”
A vida nos Estados Unidos não foi fácil. “Foi uma adaptação forçada, uma decisão rápida. Tivemos que administrar principalmente a parte emocional dos nossos três filhos adolescentes. Tentamos fazer o melhor, principalmente na integração com a cultura americana. Com apoio da igreja, da parte espiritual, conseguimos organizar melhor as nossas vidas aqui.”
PRESSÕES JUDICIAIS E TENTATIVAS DE INTIMIDAÇÃO
Mesmo no exílio, as pressões continuaram. Em 2025, a Polícia Federal enviou um e-mail convocando Elisa para uma reunião por Zoom como testemunha contra o ex-presidente Bolsonaro. “Achei completamente descabido. Informei minha residência nos Estados Unidos e que isso não fazia sentido. Nem abri o link que me mandaram até porque poderia ser um hacker. Só que não era.”
Nos EUA, advogados informaram que esse tipo de abordagem é ilegal, especialmente para quem está sob pedido de asilo. “O governo brasileiro não pode agir dessa forma. Qualquer movimento deve ser feito via justiça americana.”
NOVO CONTATO COM CARVAJAL
Há cerca de um mês, Elisa conseguiu novo contato com Carvajal, por meio de um sistema monitorado da justiça americana. “Ele se mostrou totalmente aberto e disposto a colaborar. Disse que acompanha o que Maduro e Lula vêm articulando politicamente, e que reconhece esse grupo como criminoso, ocupando o poder em diversos países.”
Carvajal confirmou que o grupo está estruturado e que já sabia da vitória de Lula em 2022. “Disse que a estrutura deles é profissional, nada amador.” Elisa então aprofundou as perguntas sobre corrupção, PDVSA, Petrobras e financiamento ilegal. Carvajal pediu tempo e, recentemente, respondeu que precisaria de autorização especial das autoridades americanas para tratar dos aspectos criminais.
“Estou tentando conversar com autoridades americanas para ver até que ponto posso acessar essas informações, não só como jornalista, mas para colaborar com a justiça brasileira e internacional.”
AS NOVAS DELAÇÕES E O IMPACTO NO BRASIL
Segundo Elisa, as ações do governo dos Estados Unidos contra Maduro derivam diretamente das delações de Carvajal. “Toda a pressão internacional sobre Maduro tem como base o que Carvajal entregou. E ele tem informações também sobre o Brasil e a Colômbia. Isso pode embasar decisões internacionais sobre o grupo político que ocupa o poder no Brasil.”
A expectativa agora recai sobre a audiência de Carvajal, adiada para 19 de novembro para que a justiça americana analise novos documentos. “Se fossem provas triviais, não haveria mudança no calendário. Como houve, é porque podem mudar o rumo de muita coisa.”
Carvajal, acusado de integrar o cartel de Los Soles, nega envolvimento direto. Ele afirma que sua posição como general lhe dava acesso privilegiado às informações, mas que nunca participou das operações. A justiça americana, no entanto, sustenta que ele era membro ativo. Agora, ele tenta provar sua inocência ou colaborar por meio de delação premiada.
UM PROJETO CONTINENTAL
“O projeto de tomada de poder na América Latina por meio do narcotráfico e da destruição dos Estados Unidos é antigo e estruturado. Com o governo Trump no décimo mês, ações estão sendo implementadas para combater isso, mas não é algo que se resolve rapidamente.”
Segundo Elisa, os Estados Unidos ainda têm a Colômbia na mira e, depois, o Brasil. “Estamos trabalhando para acelerar esse processo. Os EUA são estratégicos e sabem da gravidade.”
Ela também comenta o embate diplomático entre Lula e Trump. “Lula está desafiando Trump com frequência. Trump combate o narcotráfico e Lula responde dizendo que o problema não são os traficantes, mas a sociedade. É uma tentativa de desmoralizar o governo americano.”
O FUTURO DOS EXILADOS
Elisa mantém contato com outros brasileiros exilados nos EUA, Argentina e outros países. “Recebo muitas mensagens de pessoas envolvidas no 8 de janeiro. Gostaria muito de ajudar individualmente, mas não tenho esse poder. Sou jornalista. O que posso fazer é esse trabalho de investigação, buscando impacto no governo brasileiro.”
Ela acredita que, com a desestabilização do atual governo, os exilados poderão retornar. “Acredito que, quando esse governo corrupto for desestabilizado, como aconteceu na Venezuela, todos nós que estamos em condição de asilo vamos poder respirar novamente. Esse é o meu esforço.”
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